O norueguês Old Funeral é mais conhecido pelo rumo tomado por seus integrantes após o fim da banda do que por sua própria música. Seu guitarrista, Kristian Vikernes (depois rebatizado Varg Vikernes), montou posteriormente o magistral Burzum; seu baixista/vocalista, Olve Eikemo (aka Abbath Doom Occulta), o não menos importante Immortal - ambos nomes seminais do então nascente black metal norueguês. Embora o Old Funeral não tenha alcançado o sucesso da dupla Burzum e Immortal, produziu música de inegável qualidade. Nessa coletânea dupla, lançada pela Soulseller Records, temos o que promete ser a compilação definitiva da carreira da banda. Além do ep Devoured Carcass, da demo Abduction of Limbs (ambos os registros de 1990), de uma faixa ao vivo, outra em estúdio e de uma sessão de gravação de 1992, que já constavam de compilação anterior lançada pelo selo Hammerheart, foi aqui incluída a primeira demo da banda, de 1988 - The Fart that Should Not Be (o nome "engraçadinho" definitivamente não ajuda) -, bem como outras faixas ao vivo. O material é bem heterogêneo, variando tanto a qualidade de gravação como o próprio estilo do som do Old Funeral. Na demo de 1989 (ainda sem Vikernes, mas com Abbath) ouve-se um razoavelmente bem gravado deaththrash, muito agressivo, repleto de mudanças de andamento e com um vocal desgraçado, que mais parece uma versão do Mille do Kreator (dos primórdios) sofrendo de grave infecção de garganta. Os riffs afiados me fizeram pensar numa mistura do próprio Kreator, do Pleasure to Kill, com o antigo Messiah da Suíça. O ponto negativo fica por conta das letras tolas, que conferem um clima de joke band incompatível, na minha opinião, com a direção musical mais radical seguida pela banda. Na demo posterior, de 1990, assim como no ep do mesmo ano (este último já com Vikernes, mas sem Abbath), o Old Funeral assume postura mais séria e ingressa nos domínios do death metal puro e veloz. A música, no entanto, continua complexa. Por vezes, até demais. Em determinadas faixas o excesso de variação de riffs e a constante mudança de andamentos atrapalham a unidade das músicas, fazendo-as soar mal-costuradas. Quando a banda opta pelo som mais simples e direto, os resultados são sensivelmente melhores, como na arrasadora death/grind Devoured Carcass. O vocal também adota uma abordagem declaradamente death: quando a cargo de Abbath (na demo), um pouco mais vomitado; quando a cargo do baterista (no ep), totalmente grave e gutural. A produção nesses dois registros é bem aceitável, sendo melhor no ep, que soa bem pesado. Já na sessão de estúdio gravada em 1992 (Abbath e Vikernes já estavam fora da banda), o canto de cisne do conjunto, o death metal de outrora cede espaço para um black metal de respeito, cadenciado (não há partes rápidas), no qual abundam melodias bem feitas, ótimos vocais e até passagens viking. Confira-se, a esse propósito, a excelente Alone Walking. O resultado final lembra, em alguma medida, o Immortal do Diabolical Fullmoon Mysticism. Talvez a presença do Abbath em ambas as formações tenha gerado essa aproximação no som das bandas. É uma pena que o Old Funeral tenha acabado justamente nessa época, que mostrava ser sua fase mais criativa. Anote-se, por fim, que as faixas ao vivo são muito mal gravadas e pouco acrescentam à compilação. Talvez sua única função seja revelar uma ironia: o idiota do Vikernes, que depois se tornaria um celerado mezzo neo-nazista, mezzo neo-paganista, leva com seus companheiros um cover de Agathocles (Judged by Appearance), banda de forte mensagem esquerdista, libertária e anarquista. Ideologias à parte, o Old Funeral é uma banda histórica, aqui apresentado numa coletânea bacana, que merece ter seu som mais divulgado entre os fãs de metal extremo.
Our Condolences - compilação |
Os integrantes do Old Funeral, já com maquiagem e pose da fase black metal |